Nicolas Sarkozy, ex-presidente
francês da Direita do país, alertava, no ano de 2007, para a
«consciencialização de que os nossos destinos estão agora tão interligados que
não mais podemos ignorar o que se passa nos outros países», um dos «aspetos
mais positivos da globalização», acrescentou.
A meu ver, o problema do referendo
do Brexit não é o facto de ter sido consultada a vontade do povo britânico, mas
sim, com ele, terem emergido populismos desmedidos, apoiados pelos
conservadores, os quais se aproveitaram deste frágil momento para reproduzir
discursos baseados num nacionalismo bacoco, xenofobia, intolerância e em políticas
anti-imigração de um carácter protecionista extremamente elevado. Desengane-se
quem pensa que foram apenas fatores económicos que despoletaram esta decisão.
Foi, principalmente, a vitória do preconceito face à razão. Mascaram-se de
discursos independentistas e afirmam o desejo de obter uma maior autonomia, mas
deixem-me relembrar que o Reino Unido conseguiu ter cláusulas excepcionais em
vários acordos da UE, nem tampouco partilham a mesma moeda. O Reino Unido sempre
zelou pelos seus interesses, mesmo que isso significasse complicar ou atrasar
os processos de tomada de decisão, com uma capacidade de negociação notável.
Independentemente das famílias
políticas, para mim, este referendo será sempre um retrocesso. O que vai
acontecer à livre circulação de pessoas e bens? A partir de agora, o Reino
Unido fica livre de desenhar novas políticas de asilo, de migração e políticas
protecionistas, não só económicas, mas também, ao nível da cidadania. E os
emigrantes a viver/trabalhar no Reino Unido?
Os britânicos perderam muito mais do
que o que ganharam com este referendo. A UE protagonizou avanços muito
positivos que, ao fim de tantos anos, não conseguimos reconhecer no nosso
quotidiano por os termos dado quase como que dados adquiridos. A comunidade não
se representa só pelo seu aspeto económico, mas por um conceito que muito
admiro: o de cidadania europeia. Neste sentido, a UE não é um projeto falhado!
Trouxe-nos paz e, como sempre ouvi dizer, a União faz a força. Aqui não é exceção.
Tenho muitas dúvidas que a globalização nos deixe viver sozinhos.
Voltando aos números, a Inglaterra
e o País de Gales votaram pela saída, mas vale a pena lembrar que a Escócia e a
Irlanda do Norte desejavam ficar na UE, pelo que este desfasamento pode
provocar a desunião dentro do Reino União e estimular estas “nações sem Estado”
a lutar pela sua independência. Em Abril passado, quando participei numa
conferência internacional na Universidade de Santiago de Compostela,
precisamente sob o tema «Stateless
Nations and Europe», ainda não se previa este desfecho mas já os
especialistas alertavam para a possibilidade de existir esta divergência dentro
do Reino Unido.
As vozes euro-cépticas já se
aproveitaram deste momento para convencer os europeus e o mundo de que a UE
"está a morrer" ou de que este é o fim da comunidade europeia.
Contudo, devo dizer que acredito no futuro da União e acredito que, como um
órgão vivo que ela é, este será apenas o fim de um capítulo da história da UE e
o início de um outro, representando não só uma lição para os líderes da
comunidade, como também, uma nova oportunidade para acreditarmos neste projeto.
Torna-se fundamental reviver a UE e
recolocar o projeto comunitário no caminho certo, que é, no fundo, apostar numa
ação capaz de atuar em todos os Estados-Membros. Trabalhar juntos e em uníssono
fará com que nos reconciliaremos com o projeto europeu.
Acreditei que o Bremain saísse
vencedor do referendo. Pelos vistos, estava enganada.
Rute Rita Maia
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